É
um mote bem batido e verdadeiro que a corrupção tira dinheiro do
povo,do pobre,do excluído.Então porque a
esquerda também se corrompe?No artigo anterior eu aventei algumas hipóteses
para explicá-lo ,as quais,muitas são,para mim,provadas,como eu disse lá.
Às
vezes,não raro,o pobre não tem outra alternativa senão se corromper para
subir,mesmo porquê ninguém lhe dá a mínima chance.Isto não é uma lei absoluta.Criminosos
ligados ao tráfico manipulam fortunas imensas.Um fuzil moderno custa 60 mil
reais,o suficiente para viver bem por meses.Contudo a lógica da máfia
prevalece:é difícil sair e ,às vezes,não raro,não há outra opção senão
entrar.Isto tudo tem que ser analisado.
O
criminoso deve possuir chances como todo ser humano,mas o limite da vontade de delinqüir
tem que ser distinguido pelo militante que quer lutar para solucionar a questão
social,onde o crime se forma e está localizado.Há uma diferença entre a pessoa
pobre de bem e o pobre que envereda pelo crime.
Ocorre
que,na perspectiva rousseauista de
localizar a causa na sociedade,esta “
decisão” individual de delinqüir acaba
por se constituir numa zona “ obscura”,” cinzenta”,que aguça a tentação da
vanguarda de esquerda militante.
De
um lado este militante sofreu a tentação de delinqüir;de outro, a “causa “
parece” diluir a culpa ou inocentar de pronto.Por não ter alternativa o delinqüente
não é senão uma mera repercussão da omissão da sociedade,a verdadeira
responsável.E aí a tentação cresce com a culpabilização de pessoas que não têm
possibilidade real de intervir,embora pague altos tributos ao governo.
Isto
mudou um pouco hoje em dia,mas não muito.Com variações se vê que tal
comportamento “ ambíguo” continua e nós vemos acontecer na relação da esquerda
com o poder de estado,no que é um prosseguimento da tradição de esquerda,ainda
que ela defenda direitos humanos e outros direitos.A sua relação com o direito é
instrumental,como a da burguesia.A visão de classes faz do direito uma mera
ferramenta de transformação social que,se alcançada,prescindirá dele.Quer dizer
,desde Marx e Engels e outras correntes,o direito é visto como uma forma de “
mascaramento da exploração”.A comunidade universal de Kant seria mera forma
,cuja superação,pelo conteúdo real da sociedade,era o objetivo da “ revolução”(este
tipo de raciocínio tem o reflexo e cristalização suprema no prefácio de 1857
que eu continuo analisando no meu blog A Ponte).A utopia,para esta tradição,só
existe sem o direito.
Esta
ingenuidade constrói argumentos do tipo “ A escravidão foi instituída por uma
lei”;as “tributações feudais também”,logo a lei é sempre contra o povo
oprimido.Ninguém se refere ao fato de que abolição foi uma lei e que o
feudalismo foi destruído por uma nova legislação.Presa ao critério ortodoxo de luta
de classes(só como ruptura)a tradição de esquerda acha que o direito só tem
valor dentro desta luta:se a burguesia,às vezes,não raro,usa a lei para
predominar,a esquerda faz o mesmo(pensando agir diferentemente dela).É uma
aplicação ao direito dos critérios políticos oportunistas de Lênin quanto à
democracia e ao legislativo,que ele mostrou em seu livro “ Esquerdismo, a
doença infantil do esquerdismo”.O parlamento,assim como o direito(eu estou
dizendo) são meras referências táticas para o alcance da utopia(da utopia dele).
Mas
a norma é uma inexorabilidade humana.Marx e o marxismo são obsessivamente
estatocráticos(contraditoriamente):só há direito com o estado,mas a palavra
direito é polissêmica,indicando que seu significado é mais amplo,sobre o
que é certo e errado,para além da
vontade(de mudar[de fazer a utopia]).O 68,com a sociedade
alternativa,demonstrou que o direito natural não viceja,porque tudo daria certo
se não houvesse necessidade de norma,se todos fizessem,como era de seu
projeto,o que bem entendessem(curiosamente há uma relação entre Marx e a
contracultura...).
A
norma inere à humanidade.Antes da civilização era a norma religiosa que
despontava,mas depois,com a criação do direito, a norma,como fenômeno social se
forma e talvez,na utopia,a norma ligada
diretamente ao fenômeno social é que se produza.
O
certo e o errado são sempre procurados,como uma exigência da convivência humana.Transcendem às épocas históricas.
Submetendo-a
ao crivo da conveniência da luta de classes a esquerda se iguala à
burguesia,criando um modelo que não atende aos interesses da sociedade e da
humanidade,mas aos seus.E aí a falta de fundamento real cria as “ ambigüidades”:a
vontade do criminoso passa a ter legitimidade no processo da luta(de classes).
Por
estes motivos a admissão da corrupção como parte natural da política está
presente também na esquerda,que cria modos transversos de justificação da
prática,coisa que foi revelada por Marieta Severo,no programa do Faustão no ano
passado:vale a pena se corromper se há inclusão(se é que há),que eu chamei de versão
vermelha do famoso conceito de Ademar de Barros(burguesia):” rouba mas faz”.É
uma ética Robin Hood muito chinfrim que é parte do desespero de quem está
excluído,o desejo de legitimar(legítima defesa social)a luta pela superação do
sofrimento.Mas toda a corrupção é contra ele.
O
socialismo( e o comunismo)é uma proposta de solidarização,apesar de tudo,de
todas as dificuldades.A esquerda deve evitar a corrupção ajudando ,de alguma
forma,pela solidariedade,aquele que está na miséria.A inclusão do desvio da
corrupção não tem a ver com os melhores auspícios práticos do socialismo(e do
comunismo),sendo só uma cópia do modelo comportamental da pior burguesia.
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