Morreu um dos
meus formadores morais.Morreu um dos nomes da Utopia.Morreu um dos nomes do meu
Panteão dos heróis da humanidade.
Um dos meus
sonhos como intelectual é construir um pensamento que destrua a idéia tão
tenazmente repetida ao longo do tempo e da História,segundo a qual “ Se Vis
Pacem,Para Bellum”,” Se queres paz,prepara
a Guerra”.
Se vis
pacem,Para pacem
O meu desejo
era mostrar como era possível (como é)criar um discurso e uma prática que
conduzissem a humanidade da relativa paz do cotidiano até a paz
verdadeira.Relativa paz do cotidiano porque esta mediação oculta muitas
violências,as quais devemos combater inclusive com o próprio corpo,com o boxe.A
vida exige esta preparação na qual Ali era ( e é)um mestre.
Quem me
chamou a atenção para esta possibilidade
foi exatamente esta figura
extraordinária,Muhamad Ali.
Ele que sabia
lutar,na nobre arte,o pugilismo,e era um exemplo de luta no
cotidiano,revelou-se também grande ,como tal,no plano geral da história ,e é aí que ele me inspira ,para sempre.
Numa
sociedade que glorifica a guerra,especialmente naquele momento,Ali se recusou a matar pessoas inocentes .Ele
poderia ganhar muito mais ,em termos materiais ,se associasse a sua atividade a
este plano de agressão geral que muitos dizem ser geneticamente próprio da
humanidade;mas não ,ele se colocou contra isto,arriscando a si mesmo,em nome de
algo que é utópico e que se resume na frase acima,”Se queres a paz,a prepare”.
A atitude de
Ali pode não ser esta filosofia,esta ciência capaz de acabar com todas as
guerras,mas ela é ,ad aeternitatem,uma condição imprescindível,mesmo para o homem
que ganha a vida brigando:começando ou
terminado,esta nova “ ciência” da paz se mede,se fixa,com esta ação simples de
recusa.
Num filme
documentário da década de 80 “ Conta Comigo”,Ali é mostrado num momento sublime
que cristaliza o seu pensamento ( socrático[simples]{discernidor}).Ele diz
algumas frases,que para mim,têm o mesmo valor da estela de Epicuro:”Não vou
matar pessoas de um povo que não está nos incomodando e que pertencem a uma
raça tão explorada quanto à nossa”.
Para mim esta
frase deveria ser colocada em algum lugar do mundo considerado como representativo do
que é a humanidade,talvez em algum da África,berço da espécie.Um homem brigador
se negou a fazer guerra.Esta é a mediação essencial da futura(quem
sabe)filosofia da paz,ciência da paz.
De cristão imposto a muçulmano livre
Muitos na
época, e isto continua a ter relação com o assunto anterior,achavam que a
conversão de Ali ao Islam era só uma jogada política.Diziam que como Ali,um
atleta negro ,tinha ganho o seu primeiro titulo ,o stablishment estadunidense o
obrigaria a ir à guerra para manipulá-lo e fazer a sua imagem jogar a seu
favor,a favor do poder estabelecido estadunidense.Isto é parcialmente
verdade,porque foi feito com figuras como Elvis Presley e Jimmy Hendrix.
Era
preciso,segundo este stablishment ,mostrar a todos que eles ganhavam
dinheiro,tinham sucesso por causa da sociedade americana e por isto,num momento
em que esta estava supostamente ameaçada,era preciso devolver em termos de sacrifício
pessoal a sua “ ajuda”.Era um pacto da “ liberdade”,às custas do camponês vietnamita.
Este tipo de raciocínio
também foi muitas vezes feito em relação à Gandhi.Atribuía-se às suas atitudes
religiosas de recusa e abstinência um propósito meramente político,não havendo
base religiosa em sua caminhada.Mas tudo isto é falso,porque ambos comungavam
de valores pacíficos que podem ser construídos no âmbito de qualquer
religião,já que a religião é um produto humano.
Não há na
posição de Ali qualquer forma de cinismo,mas afirmação verdadeira da sua
humanidade e tal se prova pelo sacrifício que fez e pelo perigo que correu.Em
outras épocas ele poderia ter enfrentado corte marcial,com grande chance de ser
executado.Na segunda Guerra por exemplo.
O pensamento
liberal americano admitia a recusa de participação em guerras,por motivo de fé
religiosa.Os quakers nunca foram para a guerra,mas isto mudou na primeira
guerra,no caso famoso do soldado York(tema de filme hollywoodiano,com Gary
Cooper),em que este foi convencido a mudar a sua posição religiosa em nome da
defesa,por parte dos Estados Unidos,da democracia e da civilização,que “afundava”
na Europa.
Ali dialogou
com as concepções liberais dos Estados Unidos.Ele não é um radical
destrutivo,pois argumenta com ela ,usando os próprios fundamentos da nação que
escravizou os seus antepassados,mas lhe permitiu ter dinheiro,fama e sucesso.
Ele usou dos
mesmos fundamentos para a independência
dos Estados Unidos e da Índia :discordamos dos nosso dominadores ,mas não queremos ser seus inimigos.O que queremos é dar um
exemplo axiológico transcendente,humano –universal,de que a guerra não era
justa e de modo geral sempre atinge inocentes.A guerra por mais justa que seja
tem a medida da sua irracionalidade nos prejuízos freqüentes que causa a
pessoas inocentes,direta ou indiretamente.
Em Ali não há
mediação política,mas humana e é ele e a humanidade,a utopia,que estão juntos.Da
Paz para a Paz.
Um herói
socrático
Com aquelas
palavras supraditas ele repetiu a caminhada de Sócrates,mas num sentido ainda
mais universal e melhor porque deixou uma mensagem de que não se tem o direito
de matar pessoas inocentes e que o fato de ele ser um guerreiro cotidiano não
autoriza a fundamentar a atividade profissional,a violência controlada, para objetivos ilegítimos e que a recusa vale a carreira,o sucesso,o dinheiro, a fama e
a si próprio.
MUHAMAD ALI HERÓI
DE NOSSA GENTE!
Bem
entendido,não só a nossa gente do Brasil,mas a do mundo todo da Humanidade.
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