segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Lênin ou a ciranda dos ditadores


Nos últimos anos alguns pensadores juntam num mesmo balaio os ditadores do seculo XX,Franco,Mussolini,Hitler, Stálin e também Lênin.François Furet,no “ Passado de uma Ilusão” chega  ao cúmulo de chamar Lênin de o “ pré-hitler”.Há alguns atrás ,logo depois da implosão da URSS,o fantástico revelou algumas cartas nas quais Lênin exigia que a revolução matasse em postes alguns burgueses e dizendo que a “ nossa revolução parece pudim de leite”.

Sempre foi uma tática do ocidente atribuir os males da humanidade a determinadas figuras que ficam,depois de mortas,como as únicas culpadas das coisas que aconteceram .Isto é muito conveniente para aqueles que contribuíram também   e sobreviveram.Isto é uma consequência da historiografia anglo-saxônica,o culto dos heróis de Carlyle,que atribuem qualidades excepcionais aos personagens históricos sem ver as circunstâncias,a moldura em que estes fatos se deram.
A segunda guerra é só culpa de Hitler,os males a da humanidade,de Lênin e Stálin.
Eu concordo que é preciso separar o socialismo da violência.Sempre fiz mentalmente esta separação,mas na prática isto não aconteceu.Contudo,culpar e acusar Lênin e outros,de tudo, não me parece ser senão esta tática ocidental de esconder as suas responsabilidades  em alguns destes fatos e com relação a fatos criados nele e por ele mesmo.
Napoleão é considerado o maior homem da França,mas ele cometeu crimes contra povos e pessoas iguais aos daqueles jogados nas costas dos bolcheviques.O ocidente só se refere ao crime contra o Duque d´anghien,mas Napoleão ,quando sofreu o atentado em 1803,atribuído à direita,aproveitou não só para matar o duque,responsabilzado falsamente pelo acontecido,mas também os jacobinos,a quem tanto devia quanto a sua ascenção política.Ele os colocou num navio para Madagascar e este afundou no caminho,um tipo de crime que é atribuído também a Stálin,duzentos anos depois,em inicio de carreira.
Na Espanha e na Rússia o exército napoleônico cometeu imensos crimes e ninguém se refere a nada disto,Napoleão é identificado à França  e tem homenagens post mortem.

Se é verdade que Lênin quis enforcar burgueses em postes,é preciso ver que ele se referia a uma burguesia que explorava crianças nas minas de carvão e que não queria negociar com a classe operária.
Além do mais frases violentas deste tipo são tidas no ocidente como prova de luta pela liberdade,como é o caso da famosa frase de Diderot,”só haverá justiça quando o último aristocrata for enforcado em postes na tripa do último padre”.
Os desastres da Guerra de Goya
 
Acusa-se Lênin de ter dado a ordem de matar a família Romanov,às escondidas(Trotski afirma isto na “ História da Revolução Russa”),mas os puritanos não fizeram o mesmo com o rei Carlos I Stuart?Isto não causou danos à sua família?Sem falar no caso do Rei Luiz XVI,de seu filho Luiz XVII,que morreu na prisão.Quando a burguesia faz revolução é justo,é bonito,quando a classe operária faz é crime,é monstruosidade.
E também,muitos líderes adorados em muitos lugares admitem e admitiram formas de violência,de tortura e são seguidos até hoje.
De Gaulle não fez nada para impedir que os argelinos fossem torturados na defesa do país deles.Aqui no Brasil colocamos estátuas para Getúlio Vargas que criou uma polícia especial,cuja maior aptidão era a tortura.
Eu não discuto Lênin.Não aceito o fato de se haver associado o socialismo com as violências e práticas do passado(pra quê a mùmia Lênin lá?),pois isto retira a vantagem moral do movimento e o seu caráter de novidade,mas se vamos discutir as suas ações,nós temos que discutir todos os personagens e a história e discutir um novo modo de fazer política,principalmente daqueles que querem construir a utopia,o bem da humanidade.
Não tem sentido pessoas de esquerda apoiarem,por realpolitik,Armadinejad ou Saddam.Nós temos  que sair da Realpolitik e construir uma social politik,e ir da paz à paz.
Getúlio,nosso pai

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Homo sum et humani nil a me alienum puto


A foto da família de Marx,com o " tio" Engels,provavelmente tirada num intervalo necessário da luta,me lembrou a divisa de Protágoras,o maior dos sofistas,posta no título.Explico.
Uma vez estas duas meninas puxaram o papai de lado,num outro intervalo e fizeram uma brincadeira,destas que as meninas gostam de fazer:perguntas para identificar a personalidade de quem responde.Perguntaram ao papai qual era o seu herói e ele disse que era o herói da ciência Johanes Kepler(para mim também),que morreu de fome,por culpa dos alemães(na acusação de Hegel);perguntaram qual era a sua heroína e ele respondeu que era a do poema épico de Goethe,"Faust",Gretchen.E assim foi até ao momento em que as filhas perguntaram qual era o defeito humano que o respondente considerava relevável e ele disse:credulidade.
Credulidade!para quem tinha fé(?)nos fatos,na ciência,e no trabalho de quem buscava o conhecimento esta afirmação chega a ser surpreendente,mas ela destoa daqueles que consideram Marx apenas mais um cientificista datado do século XIX.Eu já afirmei em outro lugar que o marxismo é um cientificismo,mas em muitas de suas partes ele tem um lado saudável de movimento,de dinâmica,de reconhecimento da pluralidade humana,que não se reduz ao papel explicativo da ciência.Ele era contra a monomania da ciência,da explicação e no final do questionário citando a frase-título,demonstrou respeito pela pluralidade.
Credulidade é um conceito que não diz respeito somente à religião,mas avulta em importância este significado porque ele nos remete para um problema subjacente a este tema que eu estou debatendo aqui.
Aqueles que afirmam que Marx deixou de lado,na maturidade ,as suas concepções juvenis humanísticas e o respeito pela religião ,constante de sua célebre frase "a religião é ópio do povo(esta parte inicial Frei Betto diz que foi criada por Kant),o respiro da criatura oprimida,o coração de um mundo sem coração"eu digo que discordo desta interpretação,porque isto significaria dizer que Marx agiu desta forma de maneira concessiva,o que não é admissível para alguém que produziu obras de juventude tão complexas e tão fundamentadas.Muitos foram induzidos a pensar assim porque tanto Marx como Engels não publicaram estas obras,por entenderem que elas serviram apenas " para ver com mais clareza as coisas".
Contudo,não vejo esta última assertiva como um descarte e vendo outros momentos da biografia de ambos,incluindo o questionário familiar,embora eles acreditassem num progresso humano que seria construído deixando de lado modelos arcaicos  como a religião,não pensavam que tal progresso prescindisse da persuasão,da adesão consciente das pessoas,sendo esta uma condição fundamental e a única legítima para tanto.
Uma divisa como a  de Protágoras,reforça,que,para Marx e Engels,a aceitação da pluralidade não é algo passageiro,mas constitutivo da evolução humana e parte da humanidade,para sempre.O humano é algo infinito,que só pode ser desestranhado,na sua busca e esta só se faz admitindo ,dialéticamente,que mesmo aquilo que ,no humano,não conhecemos,não nos é diferente,mas parte de nós.
O " tio" Engels,ali do lado,publicou um livro na maturidade sobre o Cristianismo primitivo,no qual ele diz que ,ressalvadas algumas diferenças,este cristianismo guarda imensas semelhanças com o movimento operário de seu tempo.Este texto pode ser achado no " Internet Marxists Archive" aqui no meu blog.
Então quando alguém,em nome do marxismo,põe os dois movimentos em contradição e se recusam a  tratar o cristianismo e o cristão como partes do progresso da humanidade eu digo:"Homo sum et humani nil a me alienum puto",cuja tradução é ,não conhece nada.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Anúncio de Palestra

Aproveitando a boa repercussão do último artigo anuncio que sexta-feira farei uma palestra pela internet(somente áudio)," Demócrito ou Pitágoras?" sobre a relação da filosofia e do conhecimento,com a vida.Como é uma palestra de divulgação,não cobro,mas aqueles que quiserem o certificado terão que contribuir ,pelo menos,com cinco reais,para a impressão do mesmo.inscrições pelo meu email ecaxeiro@hotmail.com,até quinta-feira,15 horas ou pelo telefone 21-92833269,até o mesmo dia às 18 horas.

domingo, 4 de agosto de 2013

As mãos que oram

Este famoso desenho do maior representante do renascimento Alemão,Albrecht Durer,intitulado “Mãos que oram” suscita algumas reflexões sobre moral e educação.
Conta-se que quando pequeno este pintor 

A homofobia é o antisemitismo do mundo privado

O anti-semitismo apareceu na História como uma forma de manipulação política,no seio da relação entre o cristianismo e o Império Romano,que necessitava de legitimação. Apesar das transformações na História,o fundamento é este.
Mas toda a construção da Igreja Católica,junto com a aristocracia na Idade Média,foi para dominar o mundo privado e fazê-lo ser um elemento do jogo político.Daí aparecem os casamentos entre as aristocracias,as famílias reais e assim por diante.É a origem do sexismo, a relação entre o sexo e o poder,com preeminência do último.O legítimo e saudável desejo sexual, a hedonè ,é submetido aos imperativos morais que só servem ao poder,à manutenção do poder nas mãos de poucos.
A negativa (por impossibilidade axiológica)dos judeus de participar deste esquema os colocou como um joguete ,quando o esquema não funcionava.Notadamente,quando da formação dos estados absolutistas,o anti-semitismo serviu ao propósito de culpar alguém por não querer interagir com a formação do estado-nacional,calcado na religião católica.Sem falar nos ganhos econômicos e ideológicos que esta culpabilização propiciava para os vencedores:aristocracia,monarquias e igreja católica e porque não dizer a nascente burguesia?
Hoje em dia,sem que o anti-semitismo tenha acabado,a homofobia serve a propósitos semelhantes,mas não para favorecer Estados,mas mercados,interesses econômicos e quando digo isto não me refiro somente aos homofóbicos e sim igualmente ao movimento lgbt.
O movimento lgbt é importantíssimo porque ele coloca de forma radical,inclusive para o heterossexualismo,o direito absoluto de escolher com quem estabelecer um vínculo afetivo.
Na minha opinião,e isto é uma hipótese,a homofobia resulta da inveja daquele que está inserido no esquema arcaico de que falamos acima,desde a idade média,e que,por não conseguir sair dele ataca aquele que busca a felicidade numa atitude tão radical.E da mesma forma que o anti-semitismo servia para integrar num projeto estatal setores dispersos,no plano individual aquele que é acuado para integrar o modelo arcaico,usa a agressão homofóbica para se colocar num patamar pelo menos igual ao dos seus opressores arcaicos,pais,família e igreja.Não sei ,é uma hipótese.
Isto,no entanto,gera mais e mais distorções.No plano ideológico e nos dias de hoje ,o anedotário quanto à homoafetividade esconde não raro outros preconceitos e também esconde a intenção agressiva e excludente quanto àquele que está fora da archè.Ele é usado pela política para crescer,como acontece com as igrejas,que em nome da defesa da família,obtêem mais fiéis ,demonizando o movimento lgbt.
No meu modo de entender o movimento lgbt,que eu defendo,comete um erro terrível.Aliás dois:em primeiro lugar se o movimento deplora a opressão arcaica,no fundo,gosta dela,pelo seu significado fálico de poder.O movimento lgbt é excessivamente,ainda,genital,quando deveria já ter equilibrado esta genitalidade com afetividade e o conceito de eros,de amor.Por necessidade de atuação no mundo real,o movimento deplora esta ascese como concessão ao ideal de amor cristão,quando poderia perfeitamente,criar uma alternativa a este idealismo castrado,no conceito de felicidade.
O segundo erro está em lutar contra o preconceito a partir do uso da mediação do mercado, quero dizer,mostrando que o movimento tem um significado de lucro,para puxar mais adeptos e a sociedade para o seu lado.Como sabemos que o mercado capitalista precisa de reprodução imediata do capital e que os conceitos bem fundados não vendem o movimento corre o risco do mercado transformar a felicidade homoafetiva em genitalidade,mais conhecida talvez por pornografia.

O que o movimento deve fazer é instituir o princípio da felicidade afetiva ,como fundamento da sexualidade e não competir com o sexismo da sociedade arcaica,porque senão ele vai ser um joguete tanto deste sistema como do mercado,que afinal são a mesma coisa.Como o anti-semitismo é dos interesses políticos.

O Papa Francisco II

Ainda tratando da visita do Papa é preciso dizer que desde a “ Rerum Novarum”,do Papa L eão XIII ,a Igreja se modificou profundamente,com o reconhecimento,por parte desta encíclica,da “ Questão Social”,até antes de muitos governos,como o do Brasil. Contudo, há que dizer que o reconhecimento foi no sentido dos governos resolverem o problema social dentro dos critérios cristãos de amor entre os homens,permanecendo inalterável o conceito cristão de não participar da política,reforçada com a declaração da “infalibilidade papal”,cristalizada por Pio IX em 1870.Este conceito ,no fundo,não trata da infalibilidade do Papa como pessoa humana,mas em comunhão com o que entende ele a divindade de Cristo e o Espírito Santo e que não é mais do que,humanamente falando,a intocabilidade do Papa,que preserva com isso,com a sua representação da Igreja na História,a sua eternidade,a sua vocação de eternidade.
È conhecida a passagem do extraordinário romance de Lampedusa “ O Leopardo”,em que o Conde de Salinas impede o pároco da aldeia(todo ansioso),de votar,numa primeira eleição chinfrim na Sicilia,alegando que o compromisso dele não era com as questões terrenas e por isto não poderia participar das eleições(deixando-o triste...).
Esta inalteração foi até ao Papa João Paulo II,que ,ao ir à Nicarágua,admoestou o padre jesuíta Ernesto Cardenal,que desobedeceu esta ordem e participou do governo da Frente de Libertação Nacional.Da época de Leão XIII,em que surgiram dissidências ,como a dos “ padres operários”, até João Paulo II,com este padre jesuíta, houve sempre este tipo de rebeldia,cujo fulcro é a “ Questão Social”,que não acabou.
Logicamente o Papa Francisco continua esta tradição,mas como o Papa João Paulo II,que protagonizou a “ opção preferencial pelos pobres” em Puebla,ele enfatiza de maneira mais forte(não radical)a necessidade de os governos expressarem os desejos dos pobres,cuja maior representação nesta última visita,foi em Manguinhos.
Embora a Igreja tenha feito sempre esta opção pelos pobres,no passado,a Igreja aconselhava aos ricos a olhar de modo diferente os pobres,dentro do espírito de amor entre as classes,sendo que as altas dirigiam o processo.
De Puebla para cá a mudança é clara:tudo o que representa riqueza e poder,domínio das classes altas vem sendo deixado de lado. A igreja fez uma inversão,pois resolveu ficar do lado dos representados e não dos representantes.
Será,no entanto isto,uma verdade?A compaixão pura e simples serve para resolver o problema social?Se a compaixão,como disse o Papa João Paulo II,em sua visita a Cuba,é o que deve nortear as relações entre os homens,que não devem ser transtornadas por revoluções,o que pode a Igreja fazer para ajudar na solução da questão social?Apesar das boas intenções do Papa Francisco a quem favoreceu o ato no qual o menino de Manguinhos reclamou do abandono do governo do Rio,que não fez e não vai fazer nada para melhorar a condição da comunidade?Em que medida o papa,como chefe de estado,e político,não se beneficia de uma situação que ele não pode resolver?Em que medida é justo que outro país venha demonstrar que nossos governos são ruins e depois não fazer nada?

Será que a Igreja não continua a mesma?