terça-feira, 13 de agosto de 2013

Homo sum et humani nil a me alienum puto


A foto da família de Marx,com o " tio" Engels,provavelmente tirada num intervalo necessário da luta,me lembrou a divisa de Protágoras,o maior dos sofistas,posta no título.Explico.
Uma vez estas duas meninas puxaram o papai de lado,num outro intervalo e fizeram uma brincadeira,destas que as meninas gostam de fazer:perguntas para identificar a personalidade de quem responde.Perguntaram ao papai qual era o seu herói e ele disse que era o herói da ciência Johanes Kepler(para mim também),que morreu de fome,por culpa dos alemães(na acusação de Hegel);perguntaram qual era a sua heroína e ele respondeu que era a do poema épico de Goethe,"Faust",Gretchen.E assim foi até ao momento em que as filhas perguntaram qual era o defeito humano que o respondente considerava relevável e ele disse:credulidade.
Credulidade!para quem tinha fé(?)nos fatos,na ciência,e no trabalho de quem buscava o conhecimento esta afirmação chega a ser surpreendente,mas ela destoa daqueles que consideram Marx apenas mais um cientificista datado do século XIX.Eu já afirmei em outro lugar que o marxismo é um cientificismo,mas em muitas de suas partes ele tem um lado saudável de movimento,de dinâmica,de reconhecimento da pluralidade humana,que não se reduz ao papel explicativo da ciência.Ele era contra a monomania da ciência,da explicação e no final do questionário citando a frase-título,demonstrou respeito pela pluralidade.
Credulidade é um conceito que não diz respeito somente à religião,mas avulta em importância este significado porque ele nos remete para um problema subjacente a este tema que eu estou debatendo aqui.
Aqueles que afirmam que Marx deixou de lado,na maturidade ,as suas concepções juvenis humanísticas e o respeito pela religião ,constante de sua célebre frase "a religião é ópio do povo(esta parte inicial Frei Betto diz que foi criada por Kant),o respiro da criatura oprimida,o coração de um mundo sem coração"eu digo que discordo desta interpretação,porque isto significaria dizer que Marx agiu desta forma de maneira concessiva,o que não é admissível para alguém que produziu obras de juventude tão complexas e tão fundamentadas.Muitos foram induzidos a pensar assim porque tanto Marx como Engels não publicaram estas obras,por entenderem que elas serviram apenas " para ver com mais clareza as coisas".
Contudo,não vejo esta última assertiva como um descarte e vendo outros momentos da biografia de ambos,incluindo o questionário familiar,embora eles acreditassem num progresso humano que seria construído deixando de lado modelos arcaicos  como a religião,não pensavam que tal progresso prescindisse da persuasão,da adesão consciente das pessoas,sendo esta uma condição fundamental e a única legítima para tanto.
Uma divisa como a  de Protágoras,reforça,que,para Marx e Engels,a aceitação da pluralidade não é algo passageiro,mas constitutivo da evolução humana e parte da humanidade,para sempre.O humano é algo infinito,que só pode ser desestranhado,na sua busca e esta só se faz admitindo ,dialéticamente,que mesmo aquilo que ,no humano,não conhecemos,não nos é diferente,mas parte de nós.
O " tio" Engels,ali do lado,publicou um livro na maturidade sobre o Cristianismo primitivo,no qual ele diz que ,ressalvadas algumas diferenças,este cristianismo guarda imensas semelhanças com o movimento operário de seu tempo.Este texto pode ser achado no " Internet Marxists Archive" aqui no meu blog.
Então quando alguém,em nome do marxismo,põe os dois movimentos em contradição e se recusam a  tratar o cristianismo e o cristão como partes do progresso da humanidade eu digo:"Homo sum et humani nil a me alienum puto",cuja tradução é ,não conhece nada.

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