A
foto da família de Marx,com o " tio" Engels,provavelmente
tirada num intervalo necessário da luta,me lembrou a divisa de
Protágoras,o maior dos sofistas,posta no título.Explico.
Uma
vez estas duas meninas puxaram o papai de lado,num outro intervalo e
fizeram uma brincadeira,destas que as meninas gostam de
fazer:perguntas para identificar a personalidade de quem
responde.Perguntaram ao papai qual era o seu herói e ele disse que
era o herói da ciência Johanes Kepler(para mim também),que morreu
de fome,por culpa dos alemães(na acusação de Hegel);perguntaram
qual era a sua heroína e ele respondeu que era a do poema épico de
Goethe,"Faust",Gretchen.E assim foi até ao momento em que
as filhas perguntaram qual era o defeito humano que o respondente
considerava relevável e ele disse:credulidade.
Credulidade!para
quem tinha fé(?)nos fatos,na ciência,e no trabalho de quem buscava
o conhecimento esta afirmação chega a ser surpreendente,mas ela
destoa daqueles que consideram Marx apenas mais um cientificista
datado do século XIX.Eu já afirmei em outro lugar que o marxismo é
um cientificismo,mas em muitas de suas partes ele tem um lado
saudável de movimento,de dinâmica,de reconhecimento da pluralidade
humana,que não se reduz ao papel explicativo da ciência.Ele era
contra a monomania da ciência,da explicação e no final do
questionário citando a frase-título,demonstrou respeito pela
pluralidade.
Credulidade
é um conceito que não diz respeito somente à religião,mas avulta
em importância este significado porque ele nos remete para um
problema subjacente a este tema que eu estou debatendo aqui.
Aqueles
que afirmam que Marx deixou de lado,na maturidade ,as suas concepções
juvenis humanísticas e o respeito pela religião ,constante de sua
célebre frase "a religião é ópio do povo(esta parte inicial
Frei Betto diz que foi criada por Kant),o respiro da criatura
oprimida,o coração de um mundo sem coração"eu digo que
discordo desta interpretação,porque isto significaria dizer que
Marx agiu desta forma de maneira concessiva,o que não é admissível
para alguém que produziu obras de juventude tão complexas e tão
fundamentadas.Muitos foram induzidos a pensar assim porque tanto Marx
como Engels não publicaram estas obras,por entenderem que elas
serviram apenas " para ver com mais clareza as coisas".
Contudo,não
vejo esta última assertiva como um descarte e vendo outros momentos
da biografia de ambos,incluindo o questionário familiar,embora eles
acreditassem num progresso humano que seria construído deixando de
lado modelos arcaicos como a religião,não pensavam que tal
progresso prescindisse da persuasão,da adesão consciente das
pessoas,sendo esta uma condição fundamental e a única legítima
para tanto.
Uma
divisa como a de Protágoras,reforça,que,para Marx e Engels,a
aceitação da pluralidade não é algo passageiro,mas constitutivo
da evolução humana e parte da humanidade,para sempre.O humano é
algo infinito,que só pode ser desestranhado,na sua busca e esta só
se faz admitindo ,dialéticamente,que mesmo aquilo que ,no humano,não
conhecemos,não nos é diferente,mas parte de nós.
O "
tio" Engels,ali do lado,publicou um livro na maturidade sobre o
Cristianismo primitivo,no qual ele diz que ,ressalvadas algumas
diferenças,este cristianismo guarda imensas semelhanças com o
movimento operário de seu tempo.Este texto pode ser achado no "
Internet Marxists Archive" aqui no meu blog.
Então
quando alguém,em nome do marxismo,põe os dois movimentos em
contradição e se recusam a tratar o cristianismo e o cristão
como partes do progresso da humanidade eu digo:"Homo sum et
humani nil a me alienum puto",cuja tradução é ,não conhece
nada.
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